Câncer de pulmão: a importância da prevenção e diagnóstico precoce


O câncer de pulmão é um dos mais incidentes do mundo, ocupando a primeira posição entre os homens e a terceira entre as mulheres.¹ No Brasil, a doença foi responsável por 28 620 mortes em 2020. No fim do século 20, a enfermidade se tornou uma das principais causas de morte evitáveis.² Justamente com foco na prevenção, o Agosto Branco, instituído há cinco anos, tem como objetivo levar informação e conscientizar a população.

Isso porque o cigarro é, de longe, o maior fator de risco para a doença – cerca de 85% dos casos de câncer de pulmão diagnosticados estão associados ao consumo de derivados de tabaco. De acordo com o dr. William William (CRM-SP 104421), diretor de oncologia e hematologia do Hospital BP e professor adjunto associado do MD Anderson Cancer Center, outros fatores, como exposição a substâncias nocivas e até mesmo a poluição, também levam ao risco de contrair a doença. Mas nada chega perto do cigarro. Segundo ele, é preciso lembrar que o tabagismo também é considerado uma doença.

Câncer de pulmão e o tabagismo


Um levantamento da Global Lung Cancer Coalition (GLCC), feito em 2017, mostrava que havia um grande estigma em torno da doença relacionado ao tabagismo. Na época, 21% dos entrevistados de 25 países afirmavam ter menos simpatia por indivíduos com câncer de pulmão do que em relação a pacientes com outras neoplasias. No Brasil, o percentual foi acima da média mundial, chegando a 29%. Esse preconceito, que ainda existe, pode ter impacto negativo nas pessoas que vivem com câncer de pulmão e em seus familiares, além de gerar desinformação.³

“É muito cruel e não é correto colocar um estigma em um paciente que fumou e adoeceu. Ninguém fuma porque quer, há circunstâncias que levam a pessoa a fumar. Constitui-se um vício químico, há alterações cerebrais que fazem com que as pessoas fiquem dependentes daquela substância. É uma enfermidade que precisa ser tratada com planos de ação, suporte psicológico e, por vezes, com medicamentos”, diz o dr. William William.

A oncologista clínica e coordenadora regional de São Paulo do Hospital Nove de Julho/Dasa, dra. Carolina Kawamura (CRM-SP 119713), afirma, ainda, que a vergonha que os pacientes tabagistas sentem, associada ao medo do preconceito, pode dificultar também o diagnóstico precoce. “Se o paciente conta para o seu médico que é tabagista, já fica definido ali um risco maior de ter câncer de pulmão. Assim, o profissional pode incluir no check-up anual, por exemplo, exames complementares que favoreçam o diagnóstico da condição ainda no seu início”, afirma.

Exames e diagnóstico


O exame citado pela dra. Carolina é a tomografia computadorizada com baixa dose de radiação (TCBD), uma modalidade de radiografia especializada para rastreamento de câncer de pulmão que pode ser comparada ao papel da mamografia para o câncer de mama.⁴

Não há ainda uma diretriz oficial no país, mas a recomendação da TCBD, como conta o dr. William William, baseada em estudos, é para pacientes acima de 50 anos que tiveram exposição ao cigarro por 20 anos ou mais. Esse tipo de rastreamento é importante principalmente porque o câncer de pulmão costuma ser silencioso e apresenta sintomas – como tosse, dor no peito, falta de ar, falta de apetite, emagrecimento e fadiga – geralmente quando já se disseminou, dificultando, inclusive, o tratamento.⁵

“Apresentada alguma alteração no exame, o diagnóstico de certeza é feito por meio da biópsia. O patologista vai nos dizer o subtipo do câncer. Quando diagnosticado em estágio inicial, muitas vezes a cirurgia e algum tratamento complementar, conhecido como tratamento adjuvante, já resolvem o problema e as chances de cura são grandes. Quando em estágios mais avançados, temos que olhar para outros tipos de tratamento”, ressalta o diretor.

Medicina de precisão e tratamentos personalizados


A dra. Carolina explica que o câncer de pulmão primário – aquele que se desenvolve no pulmão – pode ter alguns diferentes tipos: de pequenas células e de não pequenas células e, dentro desse último, podem ser divididos entre adenocarcinoma, carcinoma escamoso e de grandes células. Hoje, com a ajuda da medicina de precisão, que alia os dados já convencionalmente utilizados para diagnóstico e tratamento ao perfil genético do indivíduo,6 é possível entender o tumor em nível celular e, assim, definir o melhor tratamento para cada caso.

“Vários tipos de testes, que antigamente só eram feitos no exterior, agora estão disponíveis em laboratórios de qualidade no Brasil. Inclusive, há a possibilidade de ter acesso a eles sem custo, por meio de um consórcio de empresas da indústria farmacêutica. É uma tecnologia que analisa o DNA da célula tumoral e, assim, conseguimos entender o comportamento daquele câncer”.

O diagnóstico mais refinado leva a um tratamento também mais personalizado, que hoje conta com a ajuda de importantes inovações, como a imunoterapia e a terapia-alvo. “A imunoterapia tem mudado a história natural da doença. Tem a capacidade de fazer com que o sistema imunológico consiga combater o tumor. É uma das estratégias mais modernas dos últimos anos. E a terapia-alvo, que teve a maior parte de seus medicamentos aprovados nos últimos cinco anos e é indicada quando o paciente tem apresentação tumoral com mutação genética, age especificamente na molécula alterada”, explica a oncologista. “Dez anos atrás, não tínhamos um décimo da tecnologia de hoje, que melhora a qualidade de vida, a sobrevida e as chances de cura.”

Doença não é sentença de morte


Com os avanços da ciência e as campanhas antitabagistas, hoje é possível afirmar que o diagnóstico de câncer de pulmão não é uma sentença de morte. Além da prevenção e da detecção precoce da doença, o dr. William William ressalta a importância de uma equipe multidisciplinar atuando conjuntamente para o bem-estar e saúde de cada paciente.

“O câncer de pulmão é tão complexo que são necessários vários profissionais para chegar aos melhores resultados. Desde o exame inicial, passando pelo diagnóstico: o cirurgião, o patologista, fisioterapeutas, oncologistas, enfermeiros. É uma jornada que requer sintonia e é recomendado também que o paciente busque um centro de referência que tenha todos esses profissionais concentrados em um só lugar”, indica. Em locais onde os centros de referência não concentram todos os profissionais, a livre comunicação entre eles é fundamental para a busca desses melhores resultados de tratamento.

A dra. Carolina concorda e complementa: “Essa é uma doença desafiadora e cheia de detalhes, e vemos com satisfação a melhora da abordagem. Estudos demonstram que um paciente que é manejado dentro de um time multidisciplinar tem mais sucesso no tratamento e maior chance de cura e sobrevida com qualidade. E é exatamente isso que buscamos fazer”, conclui.

Referências:

  1. Instituto Nacional de Câncer (Inca). Ministério da Saúde. Câncer de Pulmão. Disponível em: https://www.gov.br/inca/pt-br/assuntos/cancer/tipos/pulmao. Acesso em: 20 ago 2022.
  2. Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica (SBOC). Pesquisa aponta estigma contra pacientes com câncer de pulmão. Disponível em: https://www.sboc.org.br/noticias/item/1129-pesquisa-aponta-estigma-contra-pacientes-com-cancer-de-pulmao. Acesso em: 20 ago 2022.
  3. Associação Nacional de Hospitais Privados (ANAHP). Tomografia computadorizada de baixa dose – Uma arma eficiente no diagnóstico precoce do câncer de pulmão. Disponível em: https://www.anahp.com.br/noticias/noticias-hospitais-membros/tomografia-computadorizada-de-baixa-dose-uma-arma-eficiente-no-diagnostico-precoce-do-cancer-de-pulmao/. Acesso em: 20 ago 2022.
  4. Oncoguia. Sinais e sintomas do câncer de pulmão. Disponível em: http://www.oncoguia.org.br/conteudo/sinais-e-sintomas-do-cancer-de-pulmao/1576/197/. Acesso em: 20 ago 2022.
  5. Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Medicina de precisão: o que é e que benefícios traz? Disponível em: https://www.ipea.gov.br/cts/pt/central-de-conteudo/artigos/artigos/95-medicina-de-precisao-o-que-e-e-que-beneficios-traz. Acesso em: 20 ago 2022.

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